domingo, 8 de agosto de 2010

Uma campeã nem sempre vence

Desde pequena sempre tive tudo que eu quis. Meus pais me tratavam como se eu fosse filha única, apesar de não ser; apenas era a caçula. Estudei sempre nas melhores instituições de ensino da cidade, onde aprendi a ser bem mais que uma boa aluna, aprendi a ser uma cidadã do mundo. Sempre fui destaque nos esportes que praticava. Na ginástica rítmica desportiva ganhei por 8 anos consecutivos o troféu que premiava as melhores do ano, fui pentacampeã brasileira, tricampeã mundial e cheguei a conquistar 2 medalhas de ouro nas olimpíadas (sempre competindo no solo). No nado sincronizado, meu dueto ganhou o estadual desde que comecei a competir, há 5 anos; contudo, infelizmente, nunca cheguei a competir no brasileiro, porque a GR sempre foi minha paixão verdadeira, a qual eu dedicava mais tempo de treinamento, e as datas das competições sempre coincidiam. Ganhei diversas viagens graças aos meus méritos estudantis e esportivos; passei um ano na Ucrânia treinando com a equipe local para o mundial de ginástica; passei 2 meses às margens do Sena, por ter tido a maior média dentre todos os alunos da minha rede de ensino. Minha vida parece enfadonha, mas imagine o que é pra uma menina de 22 anos falar português, inglês, francês, espanhol, italiano e alemão; ter noção de búlgaro, magyar, tcheco, sueco e russo; e está aprendendo mandarim para viajar com a família para a China. Nunca ser cobrada pelos pais, porém sempre ter uma cobrança própria em relação a notas e nível de conhecimento. E sempre treinar para que quando entrar em uma competição, deixar as adversárias parecendo umas meras amadoras. É, nunca foi fácil assumir minha vida.

...Gostaria antes de continuar minha narrativa, fazer um breve comentário a meu respeito. Tenho 1,75m, cabelos ondulados e olhos cor de mel, verdes ao sol. Peso 55kg e minha barriga é retinha. Já trabalhei como modelo, embora não goste de ficar me arrumando pra ser fotografada com uma roupa, acho bajulação demais, futilidade demais. Acredito que ao nascer, algum deus deve perguntar a menina se ela quer ser bonita e fazer sucesso ou ser inteligente; acho que respondi que queria ser bonita e fazer sucesso e fui sorteada com inteligência. Modéstia e humildade não fazem muito bem o meu tipo, acho que são características de gente fracassada...

Há, sem dúvidas, aqueles que dizem que sou mimada e tenho sempre aquilo que quero, contudo, não percebem que eu luto com unhas e dentes para conseguir o que almejo e quando uma oportunidade aparece não sou de deixá-la escapar sem antes correr atrás. Costumo dar algo mais do que 100% de mim, porque sei do que sou capaz. Nunca tive problemas com relacionamentos, porque sempre fiz o tipo de menina perfeita pra qualquer menino e eles sempre me desejaram. Ah! Nem sempre.

Em uma noite de sexta-feira em que estava desanimada pra sair e desiludida com a vida, esbarrei com um menino perfeito em uma boate da minha cidade. Os olhos dele emanavam um brilho diferente, brilhavam como àquela primeira estrela que aparece no seu vespertino. A Dalva dos seus olhos sensualizavam como Vênus. Não me recordo de me encantar por uma criatura como me encantei agora. Seus olhos, apesar do brilho, tinham a cor de uma jabuticaba. Negros. Seus cabelos pareciam uma tecelagem de fios dourados; não por seu penteado, tampouco por sua organização, mas sim pela beleza que insistia em prender a minha atenção. O nariz me pareceu que tinha sido esculpido por algum renomado artista dessa arte. Igualmente belo eram seus dentes, que não se destacavam no rosto, apenas o complementavam. Sua boca carnuda e bem desenhada, provavelmente, seria mais doce do que qualquer vinho que Baco poderia me oferecer. Ele não me notou.

Cheguei a comentar com uma amiga da beleza de Júlio César. Ele, como o imperador romano, poderia ter qualquer mulher que desejasse, mas, por algum motivo, preferiu arriscar algo comigo. E deu certo. Pelos menos durante os 20 primeiros dias. Algo próprio do segundo verso do hino à bandeira me parecia muito promíscuo, agora. Os olhos outrora encantadores já eram vistos como aqueles de Capitú, na visão de Dom Casmurro. A confiança que antes era o marco da relação, a cada dia se desfazia, e eu infelizmente não sabia como cultivá-lo.

Estava eu, com todos os meus prêmios, menções honrosas e a passagem no meu primeiro vestibular, pro curso que sempre quis, agora, entregue, de certa forma, às moscas. Com o coração aos pedaços, sofrendo como um alérgico ao ácido fórmico que é atacado por um exame de abelhas africanas. Me via de mãos atadas quanto a isso. Somente ele poderia reconquistar minha confiança, e isso independia de meus esforços. Tarefa árdua, contudo, somente dele. Ele que quis enveredar por esses caminhos.

Hoje, já não sei o meu futuro. Vejo que nesse jogo de amor, traições e seduções, de pouco vale uma mulher como eu; porque dificilmente aquele companheiro de todas as horas dará o devido valor que eu tenho. Ele pouco se importará o que eu sei fazer, as premiações que tive ou até mesmo as línguas que domino. Talvez seja egoísmo meu, ou até egocentrismo, porém, se ele não me quiser, me fizer sofrer, ou não for homem suficiente pra dizer tudo o que sente, desejo que morra seco, sem nenhum amor e que sofre algumas dezenas de vezes mais o que me fez sofrer. Não sou rancorosa, apenas acredito que as obras feitas aqui, serão pagas aqui, com juros e alguma porcentagem de correção monetária. Talvez por ser acostumada a ter tudo que sempre quis, não esteja pronta para não ter você.

Um comentário:

  1. AMEI o eu-lírico feminino com um "quê" do teu sarcasmo... ta de parabéns, settinho :D

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