quarta-feira, 23 de junho de 2010

O doce veneno que vem do Oriente

Bem, antes de começarem a ler, indico a leitura do conto de Lygia Fagundes Telles, "Venha ver o pôr-do-sol" (http://marciorono.multiply.com/journal/item/53), já que o 'conto' que escrevi é uma espécie de continuação desse. Algumas descrições talvez fiquem mais claras àqueles que conhecem o conto da autora. Por fim, escrevi esse texto em algum período de 2007, no CEFET, quando a Marília (professora de português) pediu pra cada grupo escrever uma continuação da obra.



Ricardo já estava no meio da ladeira. Pensava no porquê do convite de Raquel. Estava com medo. Não, medo não, receio. Receio do que poderia acontecer a ele, já que o seu ultimo encontro com a sua, ainda, amada não fora agradável para a mesma. Ao mesmo tempo em que sentia receio, sentia uma mistura de remorsos, pelo o que fizera com Raquel, com ansiedade. Ao chegar mais perto do antigo porto abandonado, viu no horizonte, uma mulher vestida à Marguerite Gautier, não pelos vestidos de época, já que aquela não os vestia, e sim pela bela camélia que ela carregava junto ao coração, por cima da roupa. Era, sem dúvida, uma das paisagens mais belas que já tivera na vida, mais bela até do que o pôr-do-sol de outrora. A mulher com a camélia semi-dobrada na roupa, sentada em um pano, que ia do branco ao vermelho, que estava estendido sobre uma tenda branca, decorada com imagem de golfinhos, e, como se isso só não fosse suficiente, o sol estava nascendo mas já iluminava todo o campo de visão de Ricardo. A maré estava cheia.
O convite para um piquenique no píer do antigo porto estava aceito. Ricardo agora andava, elegantemente, em direção de Raquel. Antes de chegar mais perto, vira-se e confere se os cigarrinhos azuis e dourados que comprou para presentear aquela bela mulher estavam todos nos devidos lugares.
- Bom dia, querida Raquel! – disse Ricardo, sorrindo e se aproximando da mulher – Confesso que exitei em aceitar o seu convite. Mas meu amor por você é maior do que qualquer medo que eu poderia sentir...
- Medo? Medo de que “Cácá”? – perguntou secamente Raquel.
- Medo de...medo de...medo de que você estivesse chateada comigo por aquele...
- Aquele belíssimo pôr-do-sol que você me propiciou? Nunca Ricardo, nunca! – exclamou Raquel olhando profundamente nos olhos de Ricardo – Aquele por do sol é, de fato, o mais lindo do mundo – comentou Raquel, virando-se em direção ao mar – e o mais sábio. Ele me fez perceber que é você quem realmente eu amo, é você quem eu quero para sempre. - dizendo isso, Raquel volta a posicionar-se cara-a-cara com Ricardo e continua – Não quero saber de jóias, de luvas caras...
-Tome, Raquel – interrompeu Ricardo – juntei umas economias e comprei esses cigarrinhos pra você. Lembro que no nosso último encontro, você tirou um desses da sua bolsa.
- Isso mesmo, Ricardo. Havia esquecido-me de como você é atencioso. Mas, como já disse, deixei essa vida de luxo. Não quero mais ter roupas elegantes, não quero mais andar de táxi, não quero mais fumar esses cigarrinhos, – e dando um sorriso amarelado, conclui – esses cigarrinhos pilantras.
Ricardo não sabia o que falar exatamente. Raquel estava usando quase que as mesmas palavras que ele usara outrora no cemitério. Mas, durante toda a conversa, ele pensava que seria possível que eles voltassem a namorar como antes.
-Tome, Ricardo, esse suco é de graça. Você não tem que pagar. E o dinheiro não é do meu ex-namorado.
- Ex-namorado? Você disse ex-namorado? – assustou-se Ricardo.
- Sim, meu ex-namorado. Você num precisa tomar formicida agora, não mais.
Ricardo aceita educadamente o suco e rapidamente dar um gole, pra provar.
- Nossa, Raquel, que suco gostoso...
- Sim, Ricardo, muito gostoso. – caçoa Raquel – Ele é adoçado com formicida.
Ricardo, num ímpeto, fica paralisado, sua respiração começa ficar ofegante, ele sente que seus músculos estão pressionando seus ossos...
- Calma, meu amor. Estou brincando. Já disse que quero você.
- Ufa. Pensei que estivesse morrendo...
-Não, seu bobo – disse Raquel olhando novamente nos olhos de Ricardo – não vou matá-lo, não vou torturá-lo. Vou amar-te, dar-te carinho e muitos beijos.
- Raquel, sabe que esse suco, esse mar, esses golfinhos pendurados nessa tenda, me lembram daquela nossa viagem de barco?
- Ah! Não acredito que você lembrou disso. Fiz tudo isso pensando em você, naquele nosso passeio – de repente, Raquel começa a tossir – “Armand, por favor (cof cof) me leve para ver o mundo, talvez pela a última vez...”
- Ainda está a ler “A dama das Camélias” ?
- Sempre que recordo dos nossos momentos juntos, leio um pouco.
Raquel é levantada por Ricardo, que a põe nos braços. “Vamos sim, amadíssima Marguerite.”
Por um momento, eles caem na risada. Estavam muito felizes. Pareciam até crianças que brincam de roda. Raquel, como uma cobra que dá o bote, agarrar Ricardo pelo pescoço e tasca-lhe um beijo. Lábios encontraram lábios, corpo encontrou corpo.A maré já estava seca. Por um milésimo de segundo, via-se dois corações, ou seria um só? Raquel interrompe o beijo.
- Ricardo, eu sou mais bela do que a sua prima?
- Que prima? – perguntou Ricardo, perplexo.
- Ah, esquece... – disse Raquel, beijando o rosto do seu amado – Droga!
- O que foi, Raquel?
- Eu melei o seu rosto de batom, posso limpá-lo?
- E você ainda pergunta? Claro que pode.
Raquel, ao abrir a sacola do piquenique, que, a propósito, eles nem tocaram, pegou um lenço de seda. Seda chinesa, ou japonesa, ou coreana, ou melhor, oriental. Molhou um pouco com um líquido, que disse ser removedor de batom (e homens nunca sabem a respeito dos acessórios de maquiagem), e chegou próximo ao rosto de Ricardo. Agarrou o pescoço do seu Ricardo, como antes, para beijá-lo. Ricardo fechou seus olhos e esperou o beijo da sua amada. Entretanto, ao invés do beijo, sentiu o lenço de seda pressionado contra o seu nariz. Um cheiro forte invadiu suas narinas. O frágil lenço de seda mostrara-se uma arma lental, que, em poucos segundos, fez Ricardo desmaiar.
Mais do que rapidamente, Raquel tira metros e mais metros de corda da sacola de piquenique. Em questão de minutos, amarrar os pés, as mãos, os pés nas mãos e ainda poe uma fita adesiva na boca de Ricardo. Com muito esforço, conduz Ricardo pelo píer, até uma escadaria de madeira. Cuidadosamente, põe o corpo, ainda com vida, em cima de uma tábua de madeira e começa a conduzi-lo até o contêiner localizado, estrategicamente abaixo do píer.
De repente, não mais que de repente, Ricardo acorda. Já houvera passado algumas horas desde o momento do desmaio. Ricardo, imobilizado pelas cordas, tenta soltar-se, em vão. Um cheiro horrível de peixe tomava conta do espaço destinado a ele. Ao levantar o seu olhar, depara-se com a imagem de uma mulher, não mais elegante como a Dama que usava uma Camélia, mas uma com ar angelical, de um anjo vingativo. Não restaram dúvidas na cabeça de Ricardo. Aquele momento fora totalmente planejado. Estava agora arrependido de ter confiado em Raquel, assim como ela confiou nele.
- É Ricardo, o mundo às vezes muda o rumo. Sei que o momento da cripta no cemitério foi aterrorizante pra mim. Senti medo de morrer, mas agora, você não sentirá esse medo. Você acabou tudo que eu tinha de mais precioso. Meu marido, ao descobrir que fui ao seu encontro, me deixou. Minha família não quer mais me ver. Fui despedida do trabalho. E tudo isso, por causa da sua estúpida idéia. Mas, demostrarei que sou uma pessoa gentil, educada e, acima de tudo, humana.
Ao terminar essas palavras, Raquel dá um beijo por cima da fita adesiva que estava na boca de Ricardo. Só um estalinho. Repetinamente, Raquel arranca, com uma certa ira, a fita que estava na boca do rapaz. Ele grita. Ela afirma que aquilo é a única coisa que sobrará dele. Uma onda molha as calças do prisioneiro.
- Acho que está na hora, Ricardo. – disse Raquel olhando para o céu - Tempo atrás, você me fez ver, um belíssimo pôr-do-sol e eu pensei como poderia lhe retribuir. Descobri que o poente, é mais belo, quando vemos perto da pessoa que gostamos. Ele fica mais gostoso, quando o mar bate nas nossas pernas. Ele fica mais agradável, quando nossa única saída é esperar pela morte.
Dizendo essas palavras, Raquel pegou algumas Camélias e jogou dentro do contêiner, fechando-o, porém, não completamente, deixou uma abertura de pouco mais de 5 centímetros, para que, dali de dentro, Ricardo pudesse apreciar o belíssimo pôr-do-sol. A mulher outrora elegante, que ficava sensibilizada com livros que lia, agora sai com um sorriso misterioso, daquele velho porto abandonado, em quanto o sol se preparava para ir embora e o mar subia, subia e subia...

terça-feira, 22 de junho de 2010

Fatos...

Tenho algumas considerações iniciais a serem feitas.
Bem, resolvi escrever um blog porque as vezes gosto de escrever e alguns amigos e amigas, por gostarem do que eu escrevo, pediram pra eu fazer. Diferentemente de muitas pessoas, normalmente não escrevo aquilo pelo que passo no momento (reservo-me o direito da privacidade), mas em alguns casos escrevo sobre o que já passei, ora fantasiando, ora sendo realista.

Não tenho tempo pra viver atualizando aqui, tampouco tenho textos para tal feito (logo, vou usar, às vezes, textos de terceiros e atualizações vem quizenalmente).

Não sou nenhum gênio da língua portuguesa e, como bom ser humano, sou passível de erros (embora procure não comenter).


Como não pensei em nenhum título interessante pro blog, resolvi escolher esse mesmo. Retirado da obra de Clarice Lispector, "A hora da Estrela", um ponto seguido de outro ponto, segundo a autora, não tem aquela restrição de um ponto final, como também aquela abrangência da reticência, possibilitando ao leitor tirar próprias conclusões com uma visão ampla e ao mesmo tempo limitada (coisa de C.L.)

Por fim, 'mot sous le vent' (palavra ao vento, em francês) caiu como uma luva, pelo menos na minha opinião. Não tô aqui pra me tornar um Machado da vida, contudo, para agradar meus amigos que tanto gostam de ler minhas produções. Então, apenas estou jogando palavras para eles, que podem ir e vir com o vento.